quinta-feira, 24 de junho de 2010

As coisas que nunca vão acontecer

Certas tardes, combinadas com antecedência na empolgação das possibilidades, nunca vão anoitecer. Permanecerão intactas dentro do limiar do sonho, eternizadas pela memória de quem um dia as sonhou.

Certos planos nunca vão sair do papel e a vontade de torná-los reais esmorecerá, queimando junto com as folhas acobreadas das árvores após a geada.

Algumas palavras nunca serão ditas, logo as mais necessárias; vão parar no campo do pensamento e jamais fluir pelo ar em notas afinadas ou não, na melodia abrupta do coexistir.

Alguns detalhes nunca serão notados; se perderão no decorrer dos anos com a sua sutileza sendo tragada pela voracidade do tempo. A flor do vestido; o botão solto da camisa; a doçura daquele bolo de tangerina perdido em alguma manhã luminosa.

Algumas músicas nunca serão transcritas em partituras, gravadas em velhas fitas ou transpostas da mente para um instrumento. E alguns poemas só vão existir no campo das ideias, não haverá a coragem necessária para torná-los reais.

Algumas pessoas nunca vão se conhecer, enquanto outras jamais se encontrarão novamente, mesmo na busca desesperada pelo semblante familiar.

O trem errado, a esquina certa, os passos perdidos na estranha dança do desencontro.


Imagem: Árvores de Outono (1911), Egon Schiele.

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